Quando o Syriza chegou ao poder, a dívida publica tinha atingido cerca de 177% do PIB na Grécia.
O Syriza argumenta que não pode defraudar os seus eleitores. Estranho argumento! Mas afinal que promessa foi essa que fez para ganhar as eleições?
O Estado iria gastar ainda mais dinheiro, mas aos gregos iriam pagar menos impostos. Como se isto não fosse suficiente, prometeu que a Grécia iria continuar a beneficiar dos fundos da União Europeia, pois esta estava errada quando defende que quem deve, tem de pagar.
O Syriza era uma excelente escolha para os gregos, mas o mesmo não se pode dizer para os cidadãos europeus que pagam impostos, pois estas belas promessas significam na prática que estes últimos não iriam receber tão cedo o dinheiro que por meio de seus governos emprestaram à Grécia. No pior cenário (que até é o mais certo, pois já aconteceu outras vezes), teriam de enviar ainda mais dinheiro para reestruturar a dívida grega.
O Syriza em nome da honra concedida à Europa de permanecerem no euro, esta teria de reestruturar a sua dívida uma vez mais. Para isso, o Syriza propõe em nome dos mortos da II Guerra-Mundial, que os prazos para o pagamento sejam aumentados; reduzir as taxas de juros que incidem sobre a dívida total; e até mesmo simplesmente perdoar parte do valor total da dívida uma vez mais, pois dizem que essa dívida é ilegal.
Reconheço que de seguida irei entrar em campo minado, mas vou tentar não “rebentar com os meus pés”.
Na verdade, a Dívida de um país e mesmo a de um cidadão, não é para ser paga, mas sim para ser gerir e se ir pagando. Bem sei que parece absurdo o que acabei de referir, mas talvez não o seja de todo. Um Estado pode pedir dinheiro emprestado assim como qualquer cidadão, desde que tenha a capacidade para pagar. E só pode pagar se gerar riqueza e se as taxas de juros que pagar por essa dívida forem geríveis, ou seja, suportáveis. E aqui é que surge o problema, pois a Grécia antes da reestruturação da dívida em 2011, estava a pagar juros equivalentes a 7,3% do PIB, tornando obviamente a dívida insustentável. Com a reestruturação, as taxas caíram para 4% e a Dívida foi perdoada em cerca de 53%. Na prática com o perdão de dívida e com a baixa das taxas de juros, a Grécia beneficiou de uma redução de 75% da dívida. No entanto, a Grécia acha que fez um mau negócio. Apesar do mau negócio em 2012, a Grécia estava melhor que Portugal, Itália, Espanha, Irlanda e espante-se a Alemanha que estavam na altura a pagar juros mais elevados. Além disso, os prazos de vencimento da Dívida grega são ainda mais extensos do que dos restantes europeus, sendo esse prazo de cerca de 16 anos. Portugal, França e Alemanha tem um prazo de dívida de 7 anos, a Espanha, Finlândia e a Itália 6.
Provavelmente isto não é muito justo, mas o Syriza ainda acha que a Grécia está a ser tratada injustamente pela Europa, pois esta defende que já não existem condições nem para aumentar os prazos do vencimento da dívida e nem para reduzir as taxas médias de juros. Assim sendo, adivinha-se que o que na verdade o Syriza pretende é o perdão total da Dívida.
Estamos assim perante uma situação bastante caricata. Por um lado temos uma Europa que não quer conceder mais privilégios a um país que repetidamente está em situação de incumprimento, que tem deficiências tremendas no seu sistema fiscal, problemas de corrupção e a mais alta taxa de despesismo publico. Os gastos públicos na Grécia representam cerca de 57% do seu PIB e o Syriza diz que é impossível cortar nos gastos.
Por curiosidade, na terra dos malandros alemães, o gasto público representa 44,7% do PIB; a Irlanda 42,9%; a Espanha 44,8% e Portugal 48,7%. Pior do que a Grécia só mesmo Eslovénia com quase 60%. Segue-se na Lista os Estados Sociais da França, Suécia e Finlândia com valores próximos ao dos gregos, mas julgo que são incomparáveis, uma vez que estes países possuem elevadíssimas cargas fiscais.
O capitalismo assenta em num delicado sistema, controlado por forças na sua maioria ocultas e de honra duvidosa. Mas assenta igualmente num chamado “sistema de confiança”, ou seja, uma instituição financeira empresta dinheiro, porque tem confiança em o reaver. O mesmo acontece com a dívida dos estados e todo esta enorme confusão tem dado os resultados que assistimos.
Surge agora a chamada questão para €100. Então, porque os Estados da União Europeia, não são mais transigentes com a Grécia?
Você poderá dizer que a quem a Grécia deva, tem de ter paciência e aguentar com as consequências. Isso até seria uma consequência do tal jogo de mercado, pois se um investidor investiu e o investimento correu mal, então que assuma o prejuízo. Mas no caso grego, como vou tentar demonstrar, verá que as coisas não são bem assim.
Cerca de 80% da Dívida Grega é a Organismos Oficiais, ou seja aos Estados ou com relação de dependência com eles como é o caso dos bancos. Mas na realidade os Estados não tem dinheiro, pelo simples facto que esse dinheiro é dos cidadãos. Significa isto que se o seu Estado tem a receber dinheiro de um outro Estado e este não pagar, então é a si que esse Estado não paga. Pense nisso!
Concordo plenamente que em última instância, o povo e o seu direito à dignidade são mais importantes do que esta coisa de dívidas. Assim, o Syriza tem todo o direito, em nome da democracia, de dizer não à Europa. Mas não se engane por um único momento, pois não vivemos no mundo da fantasia. Se a Grécia tem o direito de dizer que não quer pagar ou não pode pagar, então face ao mesmo direito democrático, o seus credores tem o direito de se recusarem a alimentar mais o deficit publico da Grécia. Julgo que concorda comigo.
Atrevo-me a dizer que irá ainda concordar comigo quando digo que a Grécia está a fazer um mau negócio ao recusar-se a pagar, pois se não o fizer então deve preparar-se para verdadeiras restrições, pois sem financiamento terá que necessariamente entrar em uma austeridade muito pior do que a proposta.
O povo grego tem todo o direito em votar no Syriza, tem o direito de proceder a referendos e tem o direito até de dizer que não paga o que deve. Mas os bandidos dos credores, que até são mesmo bandidos, tem igualmente o direito de não emprestar mais dinheiro do que aquele que vão perder.
Não se engane ao pensar que a coragem grega é uma afronta para a Europa ou que faz tremer os alicerces europeus ou os agiotas que lhes emprestaram o dinheiro. Estes terão de uma forma ou outra o seu dinheiro, nem que seja você a pagar, mas quem vai perder mais com tudo isso são os gregos.