Sou um aficionado pela II Guerra Mundial, um leitor compulsivo desde a adolescência sobre o tema e tudo o que consegui ler sobre as causas da guerra e a ascensão de Hitler. Nunca entendi como tal personalidade pode ter ascendido ao poder num país como a Alemanha e como um acontecimento tão trágico como a II Guerra-Mundial foi possível sem que as principais potências europeias que haviam passado pela experiência da I Guerra-Mundial, não tivessem impedido um conflito ainda mais dramático.
A ascensão de Hitler ao poder é um dos factos mais surpreendentes da História contemporânea. A sua escalada de agitador político, a senhor da Alemanha e manipulador do Mundo, é uma das carreiras mais espantosas da História, e o que a possibilitou, radica muito a História do povo alemão. Temos de compreender o equivoco dos países aliados da I Guerra-Mundial de não terem percebido o enorme perigo que se estava a instalar com o crescimento das ideologia de extrema-direita. Não se explica a tremenda cegueira da França e da Inglaterra diante do rearmamento alemão e ignorarem o ódio de Hitler à França e não escondia que pretendia alterar dramaticamente a ordem instalada no pós Versalhes.
De modo paradoxal, o maior sucesso da História alemã moderna foi a “revolução que não houve” e através de uma revolução inexistente, o resultado foi um atraso constante em relação à época em que viviam. O alemão era caricaturado por vizinhos pretensiosos, pois na sua impotência não revolucionária, a nação desenvolveu um temperamento inclinado à submissão. Pela sua posição geográfica no centro da Europa, o alemão sentiu desde sempre, o complexos do cerco e da defesa. A disciplina, a severidade, a fé à austeridade do poder e à ordem e ao imperador como instância intocável, são características extraordinariamente sugestivas para a consciência alemã e explica muito este povo.
Hitler, trouxe a exigência moral de uma missão especial; o sentimento de estar no seio de um conflito apocalíptico, de obedecer a uma “lei superior”, de se ser agente de uma ideia ou de tudo ou nada que pudesse representar a génese do próprio povo.
“Desperta Alemanha!” – Este grito foi mais do que uma palavra de ordem. Era o grito de libertação e a promessa de que a Nação unida por um símbolo e um homem viveriam um novo amanhecer.
A Alemanha dos anos 30 é um enigma. Todo um mundo de rituais e crenças parece ter surgido do nada, para hipnotizar milhões de pessoas. E por entre todo o espectacular aparato militar, erguia-se a figura “messiânica” de Adolf Hitler. A dedicação de milhões de pessoas devia ser dirigida para aquele que a pretendia, desde que em troca, lhes desse aquilo por que ansiavam: Ordem, disciplina, autoridade, objectivos e sobretudo, consciência de si próprios. Milhões de pessoas consideravam que Adolf Hitler lhes podia dar tudo isto. Nele se realizava a sentença de que a História se pretendia concentrar num só homem. Ele foi o catalisador da grande mistura de nostalgias, de complexos, de razões, de frustrações, de sonhos, de miragens e de reivindicações de um povo poderoso e orgulhoso, a quem fora imposto o Tratado de Versalhes, que consideravam humilhante.
Hitler, possuía traços vulgares e no fundo, não passava de “um pobre diabo” austríaco, mas entre o espectacular aparato militar e das multidões, transformava-se num homem ardente e colérico. As suas qualidades de chefia e de oratória, a sua ritualidade agressiva e galvanizadora, mobilizaram uma parte significativa da população, particularmente os veteranos de guerra e os jovens. Provocava o temor e satisfazia as tendências sentimentais, apresentando-se diante do povo como um salvador de um mundo ameaçado.
Com uma habilidade demagógica; com instinto apurado para explorar as fraquezas psicológicas, manobrava os adversários até ficarem prontos a aceitarem o seu domínio. Era radical não só nas suas paixões como também nos seus cálculos e levava sempre as coisas ao limite extremo e esses riscos traduziam-se em triunfos. A Alemanha converteu-se num Estado altamente centralizado. O Parlamento foi reduzido à impotência; Os partidos políticos e sindicatos foram ilegalizados e todos os trabalhadores obrigados a aderir a uma frente laboral; os judeus expulsos do funcionalismo, dos cargos governamentais, do ensino e da cidadania; a imprensa estrangulada; os direitos humanos abolidos. O Estado de Adolf Hitler era Todo Poderoso e por vezes Omnipotente.
A Inglaterra que podia ter simplesmente desmantelado à nascença esse perigo evidente que se aproximava, pois na altura a Alemanha era demasiado fraca para entrar em guerra. No entanto, ignorou ignorou completamente o perigo que se aproximava. A Inglaterra pensava mesmo que Hitler representava uma esperança para a paz e optou através de uma diplomacia hipócrita, incoerente e frágil, por preservar velhas máximas tais como:
“A Inglaterra não tem amigos permanentes, mas interesses permanentes”
“Se deve haver um enterro do Tratado de Versalhes, vamos celebrá-lo, desde que seja a Alemanha a pagar o serviço fúnebres”;
“A Inglaterra está fora das políticas europeias e defende unicamente os seus interesses imperiais e cabe à França negociar com a Alemanha”.
Mas a política inglesa, deixou a França à beira de uma ataque de pânico, pois era perfeitamente perceptível que Hitler não era um homem com quem se pudesse negociar e que a Alemanha livre dos grilhões de Versalhes e na sua máxima força seria virtualmente impossível de travar, quer no campo económico, quer no campo militar.
Os dirigentes britânicos estavam demasiado incertos dos objectivos de Hitler e os franceses demasiados inseguros de si próprios para agirem com base numa avaliação que não podiam provar. O preço da aprendizagem sobre a sua verdadeira natureza foram 40 milhões de mortos. Se as democracias tivessem agido, os historiadores ainda estariam a discutir se Hitler teria sido um nacionalista mal compreendido ou um maníaco que queria dominar o mundo.
A França não ousando forjar uma aliança militar com a Rússia, escudou-se atrás de fracas alianças com países do leste europeu. As alianças funcionavam como garantias francesas para estados fracos, mas não serviam a França. Com aliados demasiado fracos e na dependência estratégica da Grã-Bretanha, que rejeitava por completo considerar qualquer acordo militar e a braços com uma crise governativa, a França estava à beira do esgotamento.
A cegueira política da Grã-Bretanha, era acompanhada por uma crença que ainda era possível manter a Alemanha no sistema de Segurança Colectiva, por isso, era necessário não a antagonizar. Esta ingenuidade vai ser muito bem aproveitada e permitiu assinatura de um Acordo Naval, que previa que a Alemanha poderia ter uma Marinha de Guerra de 35% da Marinha de Guerra da Grã-Bretanha. A Grã-Bretanha tinha-se rendido às exigências de Hitler, e em vez de condenar o rearmamento alemão, legitimou-o e foi cúmplice na violação do Tratado de Versalhes.
A solidariedade entre a Grã-Bretanha, Itália e França, deixou de ter sentido. Seguiu-se a reintegração do Sarre e da Renânia no Reich e pouco tempo depois foi decretado o serviço militar obrigatório, marcando o derrube do último bastião de Versalhes. Uma vez que as democracias o tinham aceitado como um fato consumado, as bases estratégicas para resistir a Hitler tinham desaparecido.
No final da década de 30, Alemanha tinha recuperado todas as suas capacidades, sentia-se em plena força. A sorte estava do seu lado e fazia questão de a aproveitar. Os seus inimigos já tinham feito troça suficiente, agora podia enfrentá-los. Com uma máquina de guerra excelente, um exército disciplinado e bem treinado e com uma moral a toda a prova, tinha por objectivo destruir todos aqueles que no passado a tinham ridicularizado e humilhado.
Fontes:
Stephen Ambrowse, “D-Day June 6, 1944: The Climactic Battle of World War II (1994);
As memórias de Churchill;
Joachim Fest, “The Face Of The Third Reich: Portraits Of The Nazi Leadership”; “The Face of the Third Reich: Portraits of the Nazi Leadership”; “ Inside Hitler’s Bunker: The Last Days of the Third Reich”; “Hitler”.
Henry Kissinger, “Diplomacia”