Gostaria de partilhar um texto que escrevi em 1997 e em que na altura fiz algumas previsões.
O povo alemão provou firmemente a si mesmo e ao mundo ser uma das nações mais vigorosas e poderosas do mundo. A Alemanha tornou-se poderosa devido à sucessão de governantes decididos e sensatos, que cuidadosamente administraram os recursos financeiros e políticos do Estado e os mantiveram nas mãos para os lançarem com coragem implacável sempre que surge uma oportunidade favorável.
A II Guerra-Mundial deflagrada pela Alemanha, mais não fez do que acentuar o seu isolamento. Após 6 anos de guerra, o III Reich afundou-se no meio de um trovão apocalíptico. O sonho de um império ariano milenar, tinha custado 7 milhões de mortos, a divisão do país e a consequente ocupação por forças estrangeiras.
Após 1945, a RFA vai canalizar todas as energias na tarefa de restabelecer a democracia e reconstruir a sua economia e não foram os seus diplomatas mas os seus homens de negócios e banqueiros que redescobriram o mundo e que estenderam as bases do comércio. Com reunificação, a Alemanha retomou a sua unidade e plena soberania, deixando de ter quem lhe vigiasse os passos, sendo livre de decidir o seu destino.
É notório que actualmente a Alemanha lidera todos os processos de aprofundamento da integração europeia e julgo que no futuro não existirá uma questão europeia, mas sim e apenas uma questão alemã e é do resultado da preponderância alemã que será traçado o futuro da Europa Comunitária.
A Alemanha está hoje certamente mais poderosa que antes e irá aumentar ainda mais o seu poder e influência, mas continua a privilegiar a construção europeia. As tendências mostram, por um lado, que o modelo internacional com o qual sonham os alemães, não é o dos Estados Unidos, da Rússia, da França ou da Grã-Bretanha, mas o da Suíça, país pacífico e próspero.
Quando se pensa na Europa e no futuro e nos planos que se esboçam para esse futuro, deve-se contar obrigatoriamente com a Alemanha como o factor mais seguro e mais provável desse grande jogo, do grande conflito de forças. Indubitavelmente o futuro desta Europa Comunitária terá o seu centro no gigante alemão e o peso enorme que a economia alemã irá ter no futuro será um factor essencial não meramente para o desenvolvimento do espaço comunitário, bem como o da sua própria sobrevivência.
A Alemanha é muito mais forte do que as outras potências europeias, mas a não é uma potência nuclear e não seguiu uma estratégia que correspondesse a uma lógica de vontade de potência. Passados 50 anos, de potência vencida passa a potência dominante. Os vencedores dependem dela como nunca pensaram vir a acontecer. Não se deram conta que ao construírem o Mercado Comum, acabaram por dar ao gigante o poder para impor as suas regras e pretensões.
A França deixou de ser a nação mais importante do continente, da mesma forma que o ponto de gravidade da Europa se deslocou em direcção a leste. A queda do muro e o fim de Ialta foi também o fim das esperanças e das ilusões da hegemonia política da França na Europa Ocidental. Agora, a França que tinha sacrificado o vigor da sua sociedade à grandeza do seu Estado Internacional vai ter de contar apenas com o seu próprio peso.
A Alemanha cultiva o contacto com os seus parceiros ocidentais, através de uma densa rede de convénios, consultas e visitas recíprocas uma estreita relação também reside entre Israel e a Alemanha. Esse relacionamento é intenso e positivo; ele estende-se a todos os níveis e abarca quase todos os sectores; evolui desde o estabelecimento de relações diplomáticas, transformando-se em muitos aspectos numa verdadeira amizade.
A Alemanha é definitivamente o país mais apto e melhor posicionado em termos geográficos para estabelecer uma relação privilegiada com os países do Leste europeu, pois embora os alemães estejam integrados na Europa Ocidental por razões evidentes de ordem pratica e política, emocionalmente estão ligados ao Leste. No subconsciente de muitos alemães, a Ocidente, estão os rivais tradicionais: a França e a Grã-Bretanha, enquanto que a Leste estão os que partilham uma cultura idêntica à sua e que reconhecem uma influência histórica alemã, e neste sentido, responder às dificuldades da Europa de Leste é para a Alemanha um dever, uma responsabilidade e também uma perspectiva de negócio, pois restabelece-se. Os países da Europa central e do Leste lutam pela democracia e pela economia de mercado e contam com ela para um auxílio económico e uma orientação política.
A nova Alemanha não pode, inevitavelmente e naturalmente, quedar-se satisfeita exclusivamente com o robustecimento da União Europeia. Após a reunificação, a Alemanha passou a integrar-se obviamente na Europa do Meio, mercê de circunstâncias de o centro gravitacional do continente se ter deslocado para o Oriente na sequência das transmutações ocorridas em 1989. Consequentemente, não constituiria surpresa de realce o ênfase dado por Berlim a um alargamento da União Europeia a Leste, após a reunião de todas as condições necessárias naqueles países ainda a braços com um penoso processo de transição para um modelo de economia de mercado.
Hoje em dia, constatamos que o futuro da Alemanha será ser a locomotiva política da Europa devido ao seu peso económico. A Alemanha não necessita da Comunidade Europeia para se engrandecer, pois sozinha pode perfeitamente atingir a prosperidade e tornar-se a 1.ª potência do continente, no entanto a tendência presente e creio que futura será a de optar pela continuidade e aprofundar o processo de integração.
A imprensa alemã e alguns sectores do espectro político e da opinião pública criticam Chanceler Kohl por ter sacrificado o marco alemão à vindoura moeda única. Suspeitam de uma “conspiração” quanto a Maastricht, reputando o tratado como um ardil gaulês para preservar a sua influência declinante na Europa. Outros sectores bradam contra aquilo que consideram como a impossibilidade da Alemanha manter a pretensão de desempenhar um papel significativo no mundo sem assumir os custos desproporcionados de semelhante empresa e sem se “camuflar” no seio de uma instituição como a União Europeia.
Como sempre na sua História, os alemães não confiam em si mesmos. A capacidade centrífuga da economia e da natureza alemã, tenderá inevitavelmente por transformar a União Monetária em mais um factor que irá contribuir para a sua hegemonia. O peso alemão será decisivo e no final a moeda única será uma moeda ale e sem um peso que equilibre a balança, a economia e a finança alemã serão preponderantes.
A França demasiadamente comprometida com o seu Estado Social e demasiadamente medrosa, seguirá uma tendência de ser a 2.ª carruagem do comboio europeu e estará cada vez mais dominada pela influência alemã.
A outra potência seria a “livre Inglaterra”, mas esta seguirá a sua política secular de não se envolver demasiadamente nos assuntos europeus e a defender o seu interesse. Demasiadamente pragmática, mas sensatamente prudente, sabe que o futuro da Europa passa pela germanização da economia e não irá correr riscos de ser parte deste comboio que parece ir descarrilar.
Resignados a esses desequilíbrios de poder, mas receosos deles, os europeus ocidentais com a França à frente, insistem numa federação económica europeia mais forte e mais coesa, partindo do princípio de que ela limitará a liberdade de acção da Alemanha. Mas quando mais forte e centralizada a CEE se tornar, à medida que adoptar uma moeda comum e um Banco Central único, mais forte – e não mais fraca — se tornará a influência alemã.
A emergência de um sistema germanocêntrico é, no entanto, apenas parte do desenvolvimento de uma Ost-Strategie de espantosa envergadura. Essa Ost-Strategie de rápida cristalização pressupõe que a Rússia se mantenha preocupada com os seus próprios assuntos internos e não com a Europa.
Os países com economias mais fracas como Portugal serão os mais afectados pelo óbvio alargamento europeu, pois a Alemanha irá forçar a entrada da quase totalidade dos países de Leste na Comunidade Europeia para a sua influência. Para estes países uma moeda única poderá trazer males ainda maiores, pois são demasiado fracos, demasiado corruptos e com sistemas judiciais, executivos e tributários ineficazes. Estes países acoplados a um comboio arrastado pela Alemanha, corre o risco de descarrilar e podem correr o risco de se tornarem ainda mais fracos sob o peso de se verem demasiado dependentes economicamente do centro e entrar no ciclo demasiadamente perigoso, demasiadamente imprevisível e que pode comprometer até às suas fundações a sua natureza enquanto Estados e o seu papel no futuro da Europa.
Se bem que as vertentes política e económica estejam intimamente ligadas, não há dúvida de que no aspecto económico, a Alemanha é a locomotiva da União Europeia. Para a economia alemã é de interesse vital construir o Mercado Único Europeu e manter os antigos mercados fora da comunidade e explorar novos.
A União Monetária europeia deverá ter por modelo o sistema nacional mais eficaz, e esse sistema, será o alemão, mas o Banco Central Europeu deveria dispor da independência e autoridade do Bundesbank, mas duvido que tal vá acontecer.
Quando se pensa na Europa e no futuro e nos planos que se esboçam para esse futuro, deve-se contar obrigatoriamente com a Alemanha como o factor mais seguro e mais provável desse grande jogo, do grande conflito de forças. Os alemães sabem impor-se nas melhores e nas piores condições, graças a certas virtudes que muitos insistem em considerar degenerações, graças sobretudo a um idealismo que faz corar as ideias modernas; quando se transformam fazem-no, como uma nação que tem todo o tempo à sua frente.