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O nascimento de Jesus

Os Evangelhos não foram escritos com o objetivo de relatar cronologicamente e biograficamente acontecimentos, mas tão somente propagar o eco da pregação apostólica da mensagem de Deus. Mas, as especulações de pesquisadores  surgem a todo o momento a indagar quando verdadeiramente teria nascido Jesus. A questão é sem dúvida difícil, principalmente se tomarmos apenas em consideração os textos sagrados de Lucas e Mateus. No entanto, se na nossa análise pretendermos ser fatuais, encontraremos ainda mais interrogações, como tentarei demonstrar.
Crescemos a adorar o Natal e foi-nos ensinado  que Jesus nasceu no dia 25 de Dezembro, no entanto nada na Bíblia refere essa ou qualquer outra data. Convém saber que, até o século IV, os cristãos do Ocidente não comemoravam o nascimento de Jesus.

O nascimento de Jesus

 A Bíblia não refere que Maria e José tenham chegado a Belém no dia 24 de Dezembro, então  eles podem ter chegado dias antes, o que faria mais sentido.  A Biblia apenas refere: “E aconteceu que, estando eles ali [em Belém], se cumpriram os dias em que ela havia de dar à luz” (Lucas 2:6).
No mundo pagão do século III, o culto de Mitra, também chamado de “Sol Invencível”, adquiriu grande importância no mundo romano. O império promovia durante o dia 25 de Dezembro grandes festas e jogos em homenagem ao “dies natalis” (dia do nascimento). No século seguinte, para se opor à popularidade desse Deus pagão, a Igreja resolveu situar em 25 de Dezembro o nascimento de Cristo, o novo “Sol Invencível”. Tratou-se de uma decisão política, não relacionada a um evento histórico em si.

O Papa Júlio I decretou em 350 que o nascimento de Cristo deveria ser comemorado no dia 25 de Dezembro, substituindo a veneração ao Deus Sol pela adoração ao Salvador, Jesus Cristo.
Aliás, o próprio Papa Bento XVI reconheceu publicamente e escreveu um livro (“L’Infanzia di Gesu) onde fala do erro sobre o ano de nascimento de Jesus Cristo utilizado para o início do calendário cristão, cometido no século VI pelo monge Dionysius Exiguus:

“O cálculo usado para o princípio do nosso calendário – baseado no nascimento de Jesus – foi efetuado por Dionysius Exiguus, que se enganou nas suas estimativas em alguns anos”

 Dinosysius Exiguus parece ter baseado as estimativas nas referências vagas quanto à idade com que Jesus começou a pregar e ao fato de ter sido batizado durante o tempo do Imperador Tibério. O próprio Mateus diz que Jesus nasceu no reinado de Herodes, o Grande, que ocorreu  no ano 4 a.C. Assim, a data de nascimento de Jesus poderá situar-se entre o ano 6. a.C e o ano 4. a.C.



 Diunisus Exiguus calculou que Jesus iniciou sua vida pública no 15.º  ano do reinado de Tibério César (782 de Roma), contando mais ou menos 30 anos de idade, apesar dos textos sagrados não o mencionarem. Assim, estabeleceu que Jesus nascera no ano 753/54 do calendário romano, sendo o “ano 1” da era cristã. Segundo Josefo, Herodes morreu pouco antes da Páscoa no ano 750(do calendário romano), sendo a Pascoa realizada no dia 12 de Abril. Portanto, baseado nas informações deste historiador, tem-se certo que a morte do rei Herodes ocorreu a 1 de Abril do ano 750 (do Calendário romano, ou seja Juliano, que vigorou até o Pontificado de Gregório XIII que acatou as orientações do astrónomo Chrtistoforus Clavius, publicando a bula “Inter gravíssimas”  que foi imediatamente acatada pelo mundo católico), ou seja, segundo Diunisius, Herodes teria morrido antes do nascimento de Jesus, situação que como sabemos não é verdade, pois Herodes era vivo na altura em que Jesus nasceu 4 ou 5 anos antes da data estabelecida para o início do calendário cristão.

 Para alguns autores, o nascimento de Jesus não poderia ter ocorrido no dia 25 de Dezembro, pois seria inverno em Israel, caracterizado por noites frias e em que os pastores não saíam com os rebanhos, permanecendo com eles nos seus currais, o que contraria a afirmação de Lucas:

Na mesma região havia uns pastores que estavam nos campos e que durante as vigílias da noite montavam guarda a seu rebanho”.

Encontramos aqui uma aparente contradição entre essa época do ano e o relato de Lucas, pois se no inverno os pastores mantinham os rebanhos dentro dos currais devido ao frio, então por que motivo Lucas relata que esses pastores se encontravam no campo?

Certos elementos da história do nascimento de Jesus tornaram-se parte da tradição cristã, mas que, não correspondem aos relatos no Evangelho. Dizem, por exemplo, que a Maria e José foram recusados pernoitar na estalagem, motivo pelo qual tiveram que ir para um estábulo ou gruta, onde ficavam recolhidos os animais. Ela teria  entrado em trabalho de parto na noite em que chegaram a Belém; que os pastores e os três reis se reuniram ao redor da manjedoura onde Jesus estava.

Se lermos com atenção os relatos no Evangelho, veremos um quadro um pouco diferente das tradições acrescentadas aos fatos. Mateus apenas diz que Jesus nasceu em Belém e nem mais nenhum detalhe. Lucas afirma que Jesus nasceu na “cidade de David”. Mas sabe-se que no  Antigo Testamento, Jerusalém era chamada a cidade de David, pois foi onde ele e muitos outros reis de Israel reinaram. Mas David nasceu em Belém, portanto, também era conhecida na região como a cidade de David. Os leitores judeus  entenderiam que Lucas se referia a Belém, mas este fez questão de citar o nome do local porque escrevia principalmente para crentes não judeus que não conseguiriam relacionar uma coisa com a outra.

Lucas dá-nos pistas importantes e quando descreve que José e Maria a Belém por causa do Censo, podemos entender que os dois teriam sido bem recebidos na aldeia, visto que ele era da linhagem de David. Provavelmente tinha parentes ou amigos em Belém, mas, mesmo que não tivesse, as pessoas teriam sido hospitaleiras devido à sua descendência e principalmente pelo fato de Maria estar grávida. Em circunstâncias normais, os donos da casa teriam colocado à  sua disposição o aposento para convidados  e ainda dentro do conceito de hospitalidade, comum em qualquer aldeia judaica na época, José e Maria  teriam sido recebidos pela família, parentes ou de amigos.

Jesus não nasceu num estábulo por não haver lugar na estalagem, mas nasceu no piso inferior de uma casa de campo onde eram guardados animais. O mal-entendido prender-se-á com a tradução da palavra grega “kataluma”, a mesma utilizada na Bíblia para descrever o local onde Jesus Cristo terá feito a sua última ceia com os apóstolos.
“Kataluma”, normalmente traduzida como estalagem, era de facto usada para descrever uma sala de estar de uma casa particular.  Estalagem em grego não é “kataluma”, mas sim “pandocheion”.
Mesmo que houvesse uma estalagem em Belém,  José e Maria não teriam pernoitado, uma vez que os dois terão viajado para aquele destino por terem ali família. Assim, a “kataluma”, onde o casal ficou seria uma sala para os convidados numa casa de família.

É um fato que Lucas refere que Jesus nasceu numa manjedoura e que se usaram tiras de pano para enrolar o bebé como os pobres costumavam fazer. Julgo não ser errado afirmar que o menino possa ter sido colocado na manjedoura,  a qual provavelmente foi retirada do estábulo e colocado na área principal da casa. Esta interpretação concorda com a cultura judaica da época e com a hospitalidade típica para quem visitasse a aldeia dos seus antepassados, principalmente acompanhado da esposa próxima de dar à luz. Para as pessoas da povoação, não receber um descendente de David acompanhado da sua mulher grávida seria vergonhoso.



Jesus não nasceu em 24 de dezembro e até terá nascido em Nazaré, pois os judeus eram designados ou pelo nome do pai ou pelo lugar de nascimento. Jesus teria de se chamar Jesus de José ou Jesus de Belém, algo que não aparece em nenhum texto evangelista.

De onde então vieram essas interpretações tradicionais? Muitas delas têm origem no relato registado por volta de 200 d.C., denominado Proto-evangelho de Tiago.  O livro conta a história do nascimento e vida de Maria, até o nascimento de Jesus. É com base nessa história que nasceu a ideia de que Maria teria entrado em trabalho de parto na noite em que chegou a Belém;  que Jesus teria nascido numa gruta; que José era um idoso e tinha outros filhos, e que Maria não só era virgem antes do nascimento de Jesus, mas que continuou virgem o resto da vida. Alguns desses conceitos foram incorporados às histórias tradicionais da crença protestante, católica e ortodoxa oriental.

Outra questão pertinente é a do Censo, pois a tradição sustenta que na altura do nascimento de Jesus, César Augusto emitiu um decreto que ordenava “que toda a terra habitada se registasse”.

Essa ordem já causaria insatisfação no povo em qualquer época do ano, pois todos tinham de se apresentar “na sua própria cidade”, o que em alguns casos poderia envolver uma viagem de uma semana ou mais. Assim, é pouco provável que Augusto provocasse seus súbditos ainda mais ao obrigar que viajassem de inverno.

Este desejo dos romanos em recensear as populações com o obetivo a facilitar a cobrança de impostos, torna-se numa valiosa ajuda na localização temporal dos fatos, uma vez que ocorreu exactamente 4 anos antes da morte de Herodes, no ano 8 a.C.

Entretanto, os Judeus tomaram providências no sentido de dificultar qualquer tentativa por parte dos ocupantes em contar o seu povo, pelo que, segundo a história, nas terras judaicas este recenseamento ocorrera um ano depois do restante império romano, ou seja, no ano 7 a.C. Em Belém, o recenseamento ocorrera no oitavo mês, pelo que se concluiu que, Jesus nascera provavelmente no mês de Julho ou Agosto do ano 7 a.C., altura essa que seria ideal para se sobreviver a um nascimento num estábulo com pouca proteção do clima.

 Conforme é relatado pelos textos bíblicos, no dia seguinte ao nascimento de Jesus, José fez o recenseamento da sua família, e 1 dia depois, Maria enviou uma mensagem a Isabel relatando o acontecimento. A apresentação dos bebés no templo, bem como a purificação das mulheres teria de ocorrer até aos 21 dias após o parto. Jesus foi apresentado no templo, segundo os registos locais, no mês de Setembro num sábado. Sabe-se que Setembro do ano 7 a.C. teve quatro sábados: 4, 11, 18 e 25. Como os censos em Belém ocorreram entre 10 e 24 de Agosto, o sábado de apresentação seria o de 11 de Setembro. Logo Jesus teria nascido alguns dias depois de 21 de Agosto do ano 7 a.C.

 Terá viajado ao Egito e até à Índia durante sua juventude?
Ninguém sabe o que fez até os 30 anos, que é quando aparece em público e como adquiriu todos os seus conhecimentos se viveu como carpinteiro ou ajudante de pedreiro. Aos 30 anos Jesus discuta com os doutores da lei, conhecia os textos sagrados do judaísmo e conhecia as culturas grega ou a dos gnósticos, e outras religiões como o budismo.

 Seria casado?
Era prática inconcebível para um judeu de seu tempo não ter família e descendência, já que o judaísmo é transmitido de mãe para filho. Tão forte era esse motivo que, na Bíblia, Deus pedia aos patriarcas cujas esposas eram estéreis que dormissem com uma das escravas para dar-lhes descendência.
Talvez tenha casado com Madalena, pois a ela confiou  os seus maiores segredos e que muito desagradou a Pedro:  “Por que a ela e não a nós?”, pergunta-se em um dos evangelhos gnósticos.  No dia da ressurreição apareceu a Madalena, antes mesmo de aparecer a Maria, desagradando mais uma vez a Pedro.

 Jesus talvez nem tenha nascido em Belém nem em 25 de Dezembro e tão pouco no ano 0. a. C. Jesus apenas terá sido um simples homem que nasceu sem cantos de anjos, sem magos vindos do Oriente para o adorar, sem manjedoura e sem ser perseguido por Herodes.   A História de Jesus, o seu nacimento, a sua missão, a sua mensagem e a sua morte foi a história com mais impacto em todo o mundo ocidental e aquela que mais consequências teve na vida espiritual, religiosa e mesmo política. Onde e quando nasceu é pouco importante e é apenas campo para lendas, mitos e superstições, criadas para que se cumprissem as profecias.
O Natal não trata a celebração de uma data.  A História do nascimento de Jesus carrega dentro de si o desejo do ser humano de  vez por ano comemorar a vida, apostar na paz, uma ponte para o perdão, a aceitação dos outros e comunhão com a família.

About João Fernandes

Licenciado em Relações Internacionais; Business Manager da Webmind; Blogger e múltiplos interesses nas áreas das ciências, tecnologia, História e política. Trabalha como freelancer em websites e publicidade.

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