Hoje em dia fala-se muito das relações entre os estados e da solidariedade entre eles, por isso trago a História de 2 Estados muito amigos. Amigos ao ponto de terem a mais antiga aliança de cooperação do mundo.
Já todos sabem que falo da amizade entre a Inglaterra e Portugal. Essa aliança data de 1373 e reforçada em 1386 pelo famoso tratado de Windsor. Esta aliança ainda está hoje para todos os efeitos em vigor, embora esta amizade tenha sido algo de muito questionável ao longo dos seus 6 séculos.
A Inglaterra é um dos países que mais aprecio no que respeita a Relações Internacionais, pois tem um entendimento muito especial em relação a alianças e em cumprir aquilo que promete.
No final do século XIX, as relações entre Portugal e a Inglaterra estavam muito degradas em consequência do caso do Ultimato Britânico, por isso Portugal virou-se para a Alemanha e temos de compreender as circunstâncias históricas. A Inglaterra tinha simplesmente ameaçado Portugal de lhe retirar as suas possessões coloniais e mesmo bombardear Lisboa se Portugal não respondesse positivamente ao ultimato, que consistia na retirada dos territórios entre Angola e Moçambique ou o chamado mapa cor de rosa. Portugal começou a ver com bons olhos um aliado alternativo que mostrava interesse em proteger os seus interesses e derrubar a Inglaterra como principal potência continental.
A Alemanha ofereceu-se para mediar a disputa entre Portugal e a Inglaterra, pois considerava que esse desentendimento poderia prejudicar as suas próprias políticas em África e como na altura em Portugal já existiam fortes indícios de queda do regime monárquico. A Alemanha viu uma ameaça da implementação de um regime republicano e unir-se à republicana França contra as casas reais europeias.
A Inglaterra acabou por aceitar a mediação alemã, desde que essa mediação se mantivesse secreta.
O acordo acabou por ser conseguido em 1891 em Londres. Acordo esse que acabou por ser uma verdadeira humilhação, já que Portugal foi obrigado a entregar extensos territórios e direitos de trânsito limitados, assim como económicos.
O final do século foi desastroso para Portugal, pois estava como sempre em risco de bancarrota e a braços como uma crise política. Assim, o governo português solicitou à Inglaterra a concessão de um empréstimo e dando como garantias os rendimentos alfandegários.
A Alemanha interveio e propôs à Inglaterra um empréstimo comum a Portugal, que no caso de não conseguir amortizar a divida e os juros, ficariam consignados ao serviço da divida externa portuguesa, os rendimentos das alfândegas ultramarinas de determinadas áreas do domínio português. No caso de stes rendimentos não serem suficientes, a Grã-Bretanha e a Alemanha tomariam conta desses territórios.
A Inglaterra não desejava a Alemanha como inimiga e em especial que ela se envolvesse na guerra com os Boers, aceitou a proposta e o acordo acabou por ser assinado no dia 30 de Agosto de 1898.
Em termos práticos, este acordo estabelecia a divisão do que restava do império português entre a Inglaterra e a Alemanha. Em termos simples, o norte de Angola ficaria para a Alemanha e o sul para a Inglaterra. Para a Alemanha ficaria igualmente o norte de Moçambique e o sul para a Inglaterra. Quanto a Timor, ficaria reservado para a Alemanha.
Com amigos destes, Portugal acabou por conseguir um empréstimo da França.
Apesar de tudo isto, Portugal ainda acabou por assinar um acordo com a Inglaterra onde se comprometia a não interferir na guerra da Inglaterra com os Boers e esta se comprometia a defender os territórios portugueses.
Mais uma vez, a Inglaterra deu uma lição em como interpreta as coisas a que se compromete. Por um lado viola a aliança com Portugal e faz um acordo com a Alemanha, para logo de seguida violar o acordo com a Alemanha ao fazer outro acordo com Portugal.
O inicio do século XX iria precipitar a Europa para um abismo e em relação a Portugal, as relações com a Alemanha iriam ficar destruídas. O imperialismo alemão de Guilherme II envenenaram gradualmente a convivência entre os dois países.
Para agravar ainda mais a situação, o nosso amigo inglês estava muito desagradado pela implementação da república em Portugal. Afinal, esta coisa de liberdade dos povos tem muito que se lhe diga. Por isso, em 1912 a Inglaterra procurou novamente junto da Alemanha uma revisão formal do acordo de 1898. As hostilidades entre Portugal e a Inglaterra são agravadas devido à questão do “chocolate de S. Tomé”, em que a Inglaterra acusa Portugal de praticar escravatura nas fazendas.
As negociações entre a Inglaterra e a Alemanha arrastam-se até 1913 e neste novo acordo a Alemanha obteria mais vantagens em Angola, embora abdicasse de Timor.
Este acordo estava quase pronto para ser assinado, mas a França ao ter conhecimento do mesmo, fez pressão diplomática. A Inglaterra exigiu então que não só esse acordo fosse tornado público, como também o anterior e o acordo que havia feito com Portugal. A Alemanha recusou, pois isso significaria que todos saberiam que havia sido enganada pela Inglaterra, quando esta assinou o acordo com Portugal.
A eclosão da I Guerra-Mundial em 1914 , impediu o acordo. Mas esta história faz-nos pensar que muita vezes temos de ter muita atenção com aqueles que consideramos amigos.