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A Grécia e o Euro

Admiro a grande coragem que a Grécia tem em ameaçar as forças do lado negro da força vindas da Europa, mas afinal qual o preço dessa ousada coragem?
Suponhamos que a Grécia, consiga de alguma forma voltar ao dracma, e que essa nova moeda se desvalorizasse rapidamente numa relação por exemplo de 50% (coisa que nem por sombras acredito), ou seja seriam necessários 2 dracmas para fazer 1 euro. O dracma seria uma moeda independente e com câmbio flutuante, e sua taxa de câmbio relativamente estável.
Mas a saída do euro, será sempre sem qualquer controlo e isso impedirá uma negociação com os mercados. A partir do momento em que trace esse caminho é o tiro de partida para que as pessoas acorram aos bancos, obrigando o governo a congelar as contas. Depois, seria necessário algum tempo para se fabricar dinheiro enquanto não houvesse a nova moeda seria inevitável o racionamento de alimentos. Julgo que não será sensato para os D.Quixotes, esperarem a solidariedade dos imperialistas europeus em concederem mercadorias gratuitamente enquanto esperam que os galantes e corajosos gregos resolvem os seus problemas.
De seguida, a Grécia deve prepara-se para o rompimento abrupto de todas as relações económicas e comerciais com o resto da zona euro e mesmo do mundo e assim, deve preparar-se para uma crise humanitária e mais uma vez lá terão que os corajosos gregos de apelarem à Europa por comida.

Bandeira da Grécia
O governo grego teria de ser ainda mais corajoso e para evitar o colapso do sistema bancário teria de proceder à nacionalização da banca e preparar-se para uma longa e profunda recessão devido ao fim da confiança no sistema.
Bem, será bom que o governo grego se prepar para longas noites, pois teria de se tentar financiar em outros mercados para poder fazer face às necessidades básicas da população e financiar a economia.
O mais que previsível incumprimento grego relativamente à sua dívida externa, sim, porque a dívida continua a existir e agora já não serão 320 000 000 000 de euros, mas sim 640 000 000 000 de dracmas. Desculpem, bem sei que são muitos zeros.
Claro está que os bravos do Olimpo, sem muito mais a perder, podem simplesmente dizer que todos esses zeros são unicamente isso: Zeros e recusam-se a pagar o que quer que seja. Então, todos os defensores dos bravos gregos podem saltar de alegria, pois numa 1.ª fase o governo grego terá dinheiro para pagar pensões e salários, mas passado pouco tempo esse dinheiro acabará e a Grécia iria necessitar tremendamente de financiamento apenas para que as empresas e o Estado continuassem a funcionar. Depois disso, seria a vez das empresas serem nacionalizadas.

Euro - Grécia



Entretanto, caro leitor prepare-se para socorrer você a banca e o seu Estado, pois após a recusa do governo grego em pagar aquilo que deve, alguém tem de pagar isso, certo? Decerto não estará a pensar que seja a banca a pagar ou os Estados. Lamento informar, mas o dinheiro do Estado é o seu dinheiro e as responsabilidades do Estado, são as suas responsabilidades. Quanto à Banca, se esta falir, então prepara-se para ver voar os seus depósitos. Estou certo que você, solidário como é, estará disposto por ver a renda da sua casa aumentar, os seus impostos aumentarem e apertar você o cinto.
Voltando à Grécia, quando as máquinas conseguirem finalmente “fazer” dinheiro, o novo dracma irá entrar em circulação, mas será uma moeda mais fraca do que o euro e assim as importações ficariam mais caras e a inflação vai disparar para níveis que os gregos já não se recordam e que abrirá novas páginas no guiness. E é bom que os gregos se preparem para mais escassez de bens essenciais, falências das poucas empresas que não foram nacionalizadas e a paralisação de todo o sector económico, cortes na energia, paralisação das redes viárias e quem sabe interrupções das redes de água, etc.
Mas se a Grécia sobreviver a tudo isto, talvez tenha condições para recuperar. È muito provável que possa aumentar as suas receitas através do turismo barato. A nacionalização da banca e a desvalorização da moeda pode ser acompanhada por medidas de controlo de capitais fazendo a economia crescer.
Se esta recuperação se concretizar, então estaria aberto o caminho para que outros países questionem as políticas de austeridade e a saída da moeda única seria uma opção sempre que surgissem as primeiras dificuldades, mas isto fará com que todo o projecto europeu esteja em risco. Mas tenha cuidado com esse caminho!
Se a Grécia sobreviver a tudo e se fazer as reformas que nunca fez, talvez possa vir a conhecer novos mercados para os seus produtos, até porque vão entrar em concorrência com os mercados europeus. Talvez, os cidadão gregos consigam um aumento nos níveis de emprego pelo baixo custo de mão de obra, mas também verão os seus salários reduzidos a metade e impossibilitados de comprarem aquilo que não produzem. O contribuinte grego terá de se preparar para a dura realidade de pagar impostos sobre a pouca renda, podendo levar a uma inevitável obstrução da economia pelo peso do sistema fiscal.
Com o passar do tempo, o normal é que os salários gregos possam mesmo subir, mas isso fará com que chegue ao fim aquela vantagem competitiva. E sem a protecção do euro, ninguém no seu perfeito juízo irá querer emprestar dinheiro a Grécia, pois todos irão recear novos incumprimentos e até novas moedas.
Algumas poucas empresas poderão ter acesso a financiamento e talvez se possa assistir a pagamentos em dólares ou euros, mas será muito pouco provável que as famílias tenham acesso a essa moeda. O cidadão comum, jamais voltará a ter confiança no sistema e os bancos tal como os conhecemos podem ser uma recordação. À semelhança daquilo que acontece em muitos países, é natural que quem tenha algum dinheiro, o envie para o exterior deixando o país sem capital.



Num país sem confiança alguma, acho pouco provável que exista espaço para investimento estrangeiro e a existir será sectorial e muito escasso quem sabe em novas formas de economia, mercado ou de matérias primas. Em consequência, a economia entra em uma nova fase de estagnação e o governo volta às antigas e repetidas políticas de desvalorização, aumento da inflação, controlo dos preços. E depois, com uma economia carenciada existe pouco espaço para mais tributação e poucos meios de obter receita. A consequência é simplesmente o que ainda restar do estado social, das políticas de saúde, educação. Quem sabe se a Grécia não tenha de repensar, se é que já não repensou, se quer ou não continuar a ser uma democracia. Talvez, os intelectuais ao deixarem de ter o euro para culpar, passem a culpar a democracia ou mesmo o mediterrâneo.
Restará saber até quando o povo grego estará sujeito a baixar o custo da sua mão de obra e baixar a sua qualidade de vida. Poderemos assistir a uma Cuba na Europa. Um local barato para fazer turismo e um mercado de produtos baratos. Mas os outros países que ficaram na zona euro, podem responder à ameaça de um mercado barato, impondo restrições ao comércio e mesmo ao turismo barato e sobretudo, poderão simplesmente não aceitar o dracma como moeda comercial, restando à Grécia recorrer às moedas turísticas.
A grande verdade da autonomia monetária é simples. Essa autonomia só serve para que os Estados limitem as importações, o que servirá para reduzir o padrão de vida dos seus cidadãos, até porque de uma forma geral, esses países são extremamente deficitários na produção de produtos de primeira necessidade.
Dirá o leitor: Mas isso é muito bom, pois esses países irão passar a fabricar esses produtos para seu consumo e mesmo para exportação.
Não se engane, pois para isso é necessário um investimento gigantesco e isso é coisa que os países que estão nessas condições, não terão meios para o fazer e os mercados financeiros estarão fechados.
Confesso que não entendo muito bem o que pretendem aqueles que defendem a saída do euro ou apregoam a autonomia monetária, pois na pratica defendem que a riqueza se concentre numa minoria da população, enquanto o resto terá apenas como destino ser fonte de trabalho barato e sem qualquer futuro.
Autonomia monetária sim, mas para quem tem as condições para tal, situação que infelizmente que a Grécia ou mesmo Portugal não estão em condições para realizar.
Fica a pergunta: E agora Grécia?

About João Fernandes

Licenciado em Relações Internacionais; Business Manager da Webmind; Blogger e múltiplos interesses nas áreas das ciências, tecnologia, História e política. Trabalha como freelancer em websites e publicidade.

2 comments

  1. “(…)esses países são extremamente deficitários na produção de produtos de primeira necessidade.(…)
    Pois é neste ponto que bate a trave! Temos e podemos produzir mais seja o que for com o pouco dinheiro disponível para investimento! o problema agora acumulado foram décadas de produção em coisas/negócios não urgentes ou não produtivos…..tipo começamos quase pelo telhado e esquecemos de fortalecer as paredes para segurar o mesmo e agora neste países elas começam a ruir…..Temos de ter uma visão mais futurista e concreta do que temos de recursos, o queremos e o que com o que temos e queremos fazer coisas novas ou meio inovadoras! Precisamos de projetos concretos e uma elite financeira com “tomates” (passo a expressão) para investir em pessoas e ideias inovadoras! Temos possibilidade desenvolver agricultura de ponta, em modo de produção biológica, massificada, temos também génios na área da informática, produtos alimentares, hotelaria….e temos uma das maiores áreas marítimas do mundo por explorar cientificamente e comercialmente (mas sempre de forma sustentada e biológica, nada de agora que precisamos cometamos os erros de outros países!….). O financiamento não pode estar concentrado só nos bancos! Falta os Ronaldos, os Amorins, os Belmiros deste país começarem a investir em pessoas e ideias de uma forma consistente e que se veja! Sem isso julgam que um burocrata de um banco ou instituição financeira vai acreditar no projecto ou visão do “tio manel?”…Fica a reflexão.

    • João Fernandes

      Agradeço o comentário e a reflexão e concordo com os mesmos, mas não podemos esquecer que não se chegou aqui como um passe de magia. Não existiu desinvestimento dos sectores produtivos, uma vez que esse investimento nunca existiu. Portugal foi, é, e irá a continuar a ser extremamente deficitário. Nunca produziu sequer para colmatar as suas necessidades alimentares e não se pode esquecer que recebemos de braços abertos os subsídio para deixar de produzir. Agora, lamento dizer mas já não vamos a tempo. Produzir mais, além de ser “ilegal” sob o ponto de vista de cumprimento de cotas é impossível, pois nunca se fez em Portugal sequer uma Reforma Agrária. Esse caminho de que falas leva uma ou duas gerações e nós precisamos agora, já, imediatamente. Temos o mar é verdade, mas quem vai pagar a sua exploração? A sua exploração está a ser feita por alguns países, mas estes já estão na 5.ª fase de desenvolvimento e nós ainda estamos na fase do “Temos de”.

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